Recebi essa bela crônica do jornalista, tradutor, professor e escritor vitoriense de Alto Parnaíba Berilo Vargas, radicado na cidade do Rio de Janeiro, a quem agradeço em meu nome pessoal e de toda a família Rocha, juntamente à sua irmã Maurina Vargas, por essa mensagem inesquecível sobre minha tia Tirzah de Araújo Rocha, que empreendeu a viagem natural e insubstituível no último dia 19 de novembro, pois seria egoísmo guardá-la apenas para a família.
O quase imperceptível murmúrio fluvial que fez companhia constante a Tirzah na velha casa da beira do rio repercutiu longe. Ontem tive vontade de conversar com alguém sobre a morte de sua tia e liguei para minha irmã Maurina em Brasília. Ela recebeu a notícia com espanto consternado. "Meu Deus, Tirzah!", exclamou, como se a morte tivesse levado precocemente a jovem que ela preservava na memória.
Depois li seu belo texto, falamos de Tirzah e de outros vitorienses dos tempos heroicos que já se foram, e ela lhe mandou um recado:"Diga ao Décio que fiquei muito sentida, e que seu texto me trouxe saudades de uma época e de pessoas que estão sempre guardadas lá no fundo da memória. Diga que me lembrei de Tirzah de luto, já não sei por quem. Dos seus óculos de lentes grossas. Do jeito blasé. Até da casa deles, que tinha um cheiro bom de beira de rio. Diga que cheguei a escutar o murmúrio do Parnaíba, e vi até as pedrinhas no raso".Também tive saudades, meu caro Décio. Tirzah faz parte de uma felicidade coletiva que também foi nossa. Mas a vida é assim, o desaparecimento de pessoas muito queridas é sempre um choque, um baque surdo, um vazio repentino. E, paradoxalmente, quanto mais idoso aquele que se vai, maior o silêncio, maior o vácuo da ausência: o fim, embora esperado por ser um imperativo biológico, nem por isso parece natural. Era alguém que estava conosco desde sempre, e qualquer coisa dentro de nós exige a continuação de sua presença. Só com o distanciamento do tempo a dor amortece.
Berilo me fez relembrar uma passagem descrita em prosa por nosso poeta-maior, o imortal Luiz Amaral, que, chegando de uma viagem cansativa em lombo de burro do garimpo de Boqueirão, no municipio piauiense de Gilbués, onde estava estabelecido com a esposa, tia Zenade, familiares e numerosos amigos que nunca abandonou, e hospedando-se na velha casa ribeirinha de meus avós na margem do seu cantado e encantado Velho Monge, ansioso para madrugar no bar e clube Victória de Ivan Brito, com a santa impaciência que Deus lhe deu, forçado pela prima Tirzah ele teve que retornar à hospedagem e, perdidas algumas partidas de sinuca, deixar como legado, assim como Berilo, a prosa-crônica intitulada Sinuca, pimeiramente escrita a mão no álbum de minha tia.
Eu tenho que jogar na bola 'ás'...
mas a 'sete' me priva de o fazer.
Sinuca igual, Tirzá, você me faz
pedindo-me que escreva sem saber.
Eu bem conheço e não censuro mais
esses caprichos próprios da mulher.
Quando ela quer... impõe, não volta atrás.
Que doa o seu pedido a quem doer!...
Ou 'cegar'...ou a 'branca' na caçapa...
De sinuca tamanha quem escapa
Realmente, Tirzá, não sei... não sei...
Aperto como este, só se vendo!
Mas... vamos ver - que o 'tempo' está crescendo...
Joguei na bola 'sete'... suicidei...
O soneto Sinuca está publicado na obra Meu Livro, de Luiz Amaral, à pág. 75.
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário